Espionagem: EUA vão ter mais trabalho, mas não reduzem a vigilância
1 de junho de 2015Foi uma pequena vitória, mas uma parte da seção 215 da Lei Patriótica dos Estados Unidos perdeu a validade à meia noite de domingo, 31/5. Ao menos de forma simbólica, é a primeira mudança legal a partir das denúncias do espião Edward Snowden, feitas em 2011.
Não significa que a vigilância dos Estados Unidos sobre o resto do mundo vai acabar – mas talvez exija um pouquinho mais de ginástica burocrática para espionar os próprios americanos.
Por Luís Osvaldo Grossmann – Convergência Digital
Essencialmente, devido ao Senado dos EUA não ter aprovado uma prorrogação dessa parte da Lei Patriótica, desde às 0h desta segunda expirou a autoridade legal para as agências americanas coletarem dados relacionados às comunicações. Em si, o trecho que perde a validade trata do acesso pelo governo americano dos dados guardados pelas operadoras de telecomunicações – e que acabou sendo naturalmente estendido para as comunicações via internet.
Diferentes entidades, como o Sindicato das Liberdades Civis Americanas (ACLU, na sigla em inglês) ou a Access, festejaram a não renovação da Seção 215, mas exigem (notadamente a Access) que a reforma do sistema de espionagem dos Estados Unidos não pare por aí. Existe um projeto em vias de ser votado – já aprovado pela Câmara dos EUA, pode ser apreciado pelos senadores nesta semana – batizado de Freedom Act, algo como Lei Libertadora, que estabelece novos limites ao alcance da espionagem feita em outros países.
Mas como alertam diversas pessoas nos EUA, mesmo isso ainda é pouco. Na verdade, questiona-se até mesmo se a queda da Seção 215 resolve alguma coisa. Quem conhece o emaranhado legal que sustenta a espionagem americana aponta para as ‘cartas de segurança nacional’, pelas quais o FBI pode requisitar qualquer informação e a própria divulgação dessa demanda é proibida por lei. Além disso, há uma norma muito mais intrusiva e menos conhecida: a Ordem Executiva 12333, nascida ainda em 1981, durante a gestão de Ronald Reagan.
Por exemplo, enquanto a Seção 215 limita (ao menos em tese) a coleta massiva de comunicações aos chamados ‘metadados’ – hora e número das ligações – a Ordem Executiva 12333 permite que o próprio áudio das conversas seja recolhido. Em princípio, isso só é autorizado para comunicações em que ao menos um dos lados esteja fora dos EUA – mas há diversas brechas para a captura de comunicações “incidentais”.
Esse é um debate que ganhou força a partir das denúncias de Edward Snowden – e particularmente por conta de previsões muito claras da Constituição americana sobre privacidade. Mas ainda que o motor seja o repúdio à espionagem interna, o resto do mundo pode se beneficiar devido ao estado atual das telecomunicações, visto estarem todos sob o impacto da mesma modernidade que enfraquece a privacidade dos americanos: e-mails e outras formas de comunicação não são mais armazenados apenas nos EUA, mas em servidores de empresas como Google, Yahoo ou Microsoft espalhados pelo planeta.
Fonte: Convergência digital