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Como você era há 10 anos? Brincadeira no Facebook pode trazer riscos a sua privacidade

17 de janeiro de 2019

Críticos alertam que dados podem ser usados para inteligência artificial gerar padrões de envelhecimento – #10yearchallenge

Famosos, como a atriz Taís Araújo, embarcaram na brincadeira

Taís Araújo, embarcaram na brincadeira Foto: REPRODUÇÃO/Instagram

Nos últimos dias, as linhas do tempo no Facebook foram tomadas por uma brincadeira aparentemente inocente: o desafio dos dez anos. Ela consiste em compartilhar, lado a lado, duas fotografias, sendo uma de 2009 e outra recente, de 2019. Para os usuários, trata-se de uma forma de comparar dois períodos distintos na vida, escancarando melhoras — ou pioras — em uma década a partir da aparência, mas alguns especialistas em privacidade alertam que esse conteúdo pode estar sendo usado para alimentar algoritmos de inteligência artificial, que usam o reconhecimento facial para gerar padrões de envelhecimento.

Ao participar da brincadeira, os usuários estão, de certa forma, preenchendo formulários, facilitando o processo de mineração de dados. Estão dizendo como eram há dez anos e como são hoje, fornecendo informações de como aconteceu o envelhecimento”,  alerta José Antônio Milagre, especialista em Direito digital e pesquisador do Núcleo de Estudos em Web Semântica e Dados Abertos da USP.  “E os arquivos muitas vezes carregam outras informações, os chamados metadados, que dizem onde e quando foram produzidas.”

Milagre lembra que as redes sociais estão recheadas de brincadeiras e aplicações cuja finalidade é a coleta de dados. O escândalo da Cambridge Analytica está aí para provar. Por meio de um aplicativo, dados de 87 milhões de pessoas foram coletados sem consentimento para influenciar processos eleitorais.

“Traçar o reconhecimento facial e os padrões de envelhecimento não é essencialmente ruim. Pode ajudar na identificação de pessoas desaparecidas, por exemplo, mas nunca se sabe para quais fins a tecnologia será aplicada “, comenta Milagre. “Por exemplo, seguradoras podem considerar que uma pessoa envelhece muito rápido e aumentar os preços de planos e seguros. Esses dados podem ser usados para prejudicar os cidadãos, que nunca saberão o motivo. As pessoas precisam ter em mente que ao compartilhar informações, elas podem ser usadas para fazer inferências sobre as suas vidas.”

Ex-ministro entra na brincadeira

Ministro Henrique Meireles

Mas para Carlos Affonso, diretor do ITS, o pânico é injustificável. Segundo ele, não é preciso temer que alguém vá utilizar técnicas de reconhecimento facial nas imagens publicadas na rede. Isso já é feito. Não apenas o Facebook, como o Google e outras empresas do setor utilizam há anos ferramentas que analisam fotografias publicadas de seus usuários.

O especialista destaca ainda que, na brincadeira, as pessoas são instruídas a compararem fotos de perfil. Essas imagens já estão nas redes sociais e são públicas. Ou seja, uma brincadeira para coletá-las é desnecessária.

“Qualquer par de fotos repetidas em sequência para provar um determinado padrão pode servir para o treinamento de algoritmos. Resta saber se esses conjuntos são bons e se são necessários. Ao que tudo indica, nesse caso eles não são bons nem necessários”, afirmou Affonso.

Na sua opinião, a base de dados seria de baixa qualidade, pois muitos internautas, em vez de usarem as fotos do perfil de 2009 e 2019, usam outras imagens aleatórias. E ninguém garante que as imagens são realmente desses anos.

Dessa forma, um algoritmo treinado com esse material teria resultados enviesados. Contudo, apesar de não crer que o desafio #10yearchallenge tenha como fim alimentar inteligências artificiais, Affonso vê um lado positivo na paranoia que está sendo criada.

Se por um lado dizer que o intuito dessa brincadeira seja treinar um algoritmo me pareça um tanto quanto extremo, por outro, não deixa de ser salutar. A pulga atrás da orelha posta por esse debate talvez ajude as pessoas a tomarem ciência de que tudo que elas publicam nas redes sociais é coletado, tratado e analisado para os mais diversos fins, comentou o especialista. “E o caso também traz para o debate a reflexão sobre o futuro dos algoritmos de reconhecimento facial, no momento em que o governo, tanto na esfera estadual como federal, está indo atrás dessas ferramentas.”

Pelo Twitter, o Facebook afirmou que o “desafio dos dez anos é um meme gerado pelos usuários, sem nosso envolvimento. È evidência da diversão das pessoas no Facebook, apenas isso“.

Fonte: O GLOBO por Sérgio Matsuura

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