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Eleição de 2016 não terá urna eletrônica | O que dizem os especialistas em Segurança da Informação?

Eleição de 2016 não terá urna eletrônica | O que dizem os especialistas em Segurança da Informação?

11 de dezembro de 2015

Desde 2000, todos os brasileiros votam em urnas eletrônicas, mas por falta de recursos, as eleições municipais de 2016 serão manuais e não com voto eletrônico.

A informação de que o contingenciamento de gastos impedirá a realização das eleições por meio eletrônico foi publicada no Diário Oficial da União dia 30 de novembro. 

Por meio de nota, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informou que mais de R$ 428 milhões deixarão de ser repassados para a Justiça Eleitoral, “o que prejudica a compra e manutenção de equipamentos necessários para as eleições de 2016”.

“O impacto maior reflete no processo de aquisição de urnas eletrônicas, com licitação já em curso e imprescindível contratação até o fim do mês de dezembro, com o comprometimento de uma despesa estimada em Duzentos milões de reais”, acrescentou a nota do TSE.

Segundo o TSE, a demora ou a não conclusão do procedimento licitatório causará “dano irreversível e irreparável” à Justiça Eleitoral,  já que as urnas que estão sendo licitadas têm prazo certo para que estejam em produção nos cartórios eleitorais.

“O contingenciamento imposto à Justiça Eleitoral inviabilizará as eleições de 2016 por meio eletrônico”, diz o texto da Portaria Conjunta número 3, assinada pelos presidentes do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandosvki; do Tribunal Superior Eleitoral, Dias Toffoli; do Tribunal Superior do Trabalho, Antonio José de Barros Levenhagen; do Superior Tribunal Militar, William de Oliveira Barros; do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Getúlio de Moraes Olveira; e pela presidenta em exercício do Superior Tribunal de Justiça, Laurita Vaz.

De acordo com a portaria, os órgãos do Poder Judiciário da União sofreram contingenciamento de R$ 1,74 bilhão.

O anúncio de que as eleições não serão feitas por urnas eletrônicas em 2016 tem causado furor nas redes sociais desde o anúncio dia 30. O termo “Eleições 2016” foi um dos assuntos mais comentados, alcançando os Trending Topics do Twitter nesta tarde.

E o que dizem os especialista em Segurança da Informação?
Vitória do voto impresso não exclui a necessidade urgente de implantação da biometria

A nova exigência do voto impresso no sistema eleitoral eletrônico, que passa a valer a partir de 2018, representará um avanço para a confiabilidade do processo, em termos de rastreabilidade, mas não exclui a necessidade de se implantar o tão adiado sistema biométrico.

Rodrigo Fragola

Rodrigo Fragola

Esta avaliação é do especialista em segurança da informação Rodrigo Fragola, que há vários anos vem defendendo o aprimoramento do modelo de urnas digitais nos fóruns de discussão do setor de segurança.

Rodrigo Fragola lembra que a inclusão da biometria – anunciada com alarde em 2006 pelas autoridades – vem sendo continuamente adiada sem uma justificativa clara.

“Depois da euforia inicial, ao primeiro sinal de problemas (como o aumento das filas e falhas de operação pelos mesários), a perspectiva de adoção da biometria ganhou subitamente o status de um eterno teste de campo, sem a devida escala”.

Na visão do executivo, a confiabilidade eleitoral exige que o modelo eletrônico ofereça não apenas a auditoria técnica, através dos códigos digitais armazenados na urna e transferidos para o computador do TSE.

É preciso que haja elementos físicos relacionados ao voto, passíveis de serem conferidos por qualquer cidadão comum, e é aí que entram o registro biométrico e a impressão do voto”, assinala.

A opinião de Fragola é compartilhada por outros especialistas, como o advogado Adriano Mendes, do Escritório Assis e Mendes, para quem tanto a adoção da biometria quanto a do voto impresso ajuda a fortalecer a confiabilidade da votação, embora necessite ser analisada com o máximo cuidado, em função de novos riscos que agrega ao lado dos pontos positivos.

As autoridades brasileiras ainda precisam mostrar como garantir a privacidade e uso legalmente restrito da identificação biométrica do cidadão. Também há várias vulnerabilidades técnicas a serem resolvidas para se garantir a inviolabilidade desse sistema, mas o reforço na identificação do eleitor, em tese, traz bons benefícios”, explica o advogado.

Além de reforçar a necessidade de se estabelecer uma agenda clara para a discussão e a adoção da identificação biométrica de todos os eleitores, Adriano Mendes chama a atenção para o risco, ainda existente, de algum retrocesso legal referente à impressão do voto. Segundo ele, mesmo após a vitória do novo modelo no congresso (por 56 votos a cinco no Senado e por 360 a 50 na Câmara), é possível que venham ocorrer ações para a reversão da exigência junto ao STF, o que mantém a questão sob suspense.

Novo Voto de Cabresto é “Lenda Urbana”

De acordo com o professor de computação da Unicamp, Diego Aranha, a forte resistência à impressão do voto acontece, em parte, devido a um índice baixo de informação ao público sobre o funcionamento do sistema. Alimenta-se, segundo ele, a “lenda urbana” de que a impressão possa representar o retorno ao voto de cabresto.

Esta é uma hipótese descartada, já que, no modelo a ser usado no Brasil, o eleitor apenas confere a versão em papel do seu voto, através de um visor transparente, e este segue por meio mecânico para uma urna física, sem qualquer contato manual”, comenta Aranha.

O professor acrescenta ser necessário também combater a crença – incentivada até pelas autoridades – na dita “inexpugnabilidade” da atual urna eletrônica brasileira. Ele menciona, a propósito, as diversas provas de campo que já demonstraram ser possível identificar o elo entre o eleitor e seu voto, a partir da comparação de sequências do mapa de votação com os registros eletrônicos da urna.

De fato, em testes públicos de segurança realizados sobre a urna atual – e nos quais o professor Aranha teve participação direta como representante da UnB em 2012 – esta possibilidade de vinculação do voto ao eleitor ficou amplamente comprovada, ao lado de várias outras vulnerabilidades da urna eletrônica.

Entre estas, está a utilização de uma única chave criptográfica para a cifração de todas as urnas (o que é comparado pelo relatório do teste com a aplicação de uma única chave mestra para os mais de 500 mil “cadeados”, que seriam as urnas do TCE).

O relatório cita ainda o uso de algoritmos obsoletos – já não recomendados para uso há pelo menos seis anos – e uma abordagem de segurança quase que exclusivamente focada na proteção contra atacantes externos, o que deixa as urnas atuais muito suscetíveis à violação por funcionários do TSE ou pessoas terceirizadas com acesso direto ao software ou aos equipamentos.

Caso venha realmente a se confirmar, a aplicação do voto impresso trará a oportunidade para a revisão de toda a estrutura de lastro do processo de votação, sem que seja necessário jogar o legado tecnológico para a obsolescência. A impressão irá garantir, além disso, um nível de confiabilidade incomensuravelmente maior para o processo eleitoral brasileiro, ao ampliar a rastreabilidade.

Adicionalmente, poderá abrir a possibilidade de uma contingência na apuração, em casos de extravio do arquivo eletrônico do voto.

Na visão do advogado Adriano Mendes, a combinação de voto eletrônico, biometria e registro impresso levará mais segurança ao cidadão e, em última instância, ajudará a melhorar o quadro atual de descrédito em relação à classe política.

“Sem dúvida, a forma híbrida, e com mais instrumentos de checagem, é a mais equânime e de melhores resultados. Cabe à sociedade debater os pontos vulneráveis, para que eles sejam devidamente cercados, e definir um marco regulatório compatível com o emprego desses novos modelos”, assinala Adriano Mendes.

Rodrigo Fragola pondera que a identificação biométrica não exige necessariamente o emprego da biometria eletrônica. Ele cita exemplos de países como o Paraguai, o Chile e a Venezuela, onde a simples tomada da digital por carimbo químico (que identifica o indivíduo e cria uma mancha de difícil remoção em seu dedo no dia da eleição) tem sido suficiente para garantir maior fidelidade ao princípio “um eleitor, um voto”.

É claro que a biometria inteligente se coaduna muito melhor com os padrões de rastreabilidade do modelo eletrônico+impresso, mas a prioridade do TSE deveria ser a de não depender exclusivamente de um registro convencional em papel, como o Título de Eleitor ou a Identidade. Afinal, trata-se de um documento lastreado exclusivamente em uma tomada fotográfica bastante fácil de ser fraudada e, quase sempre, distante da realidade física atual do portador”, completa Fragola.

Rodrigo Fragola preside a Aker Security Solutions, uma das primeiras empresas em segurança da informação com tecnologia brasileira, fundada em 1997 e participa de diversos órgãos da comunidade digital, sendo também Vice-presidente de Segurança do Sinfor (Sindicato da Indústria da Informação do DF) e Diretor Adjunto de Segurança e Defesa da Associação Brasileira de Software (Assespro-DF).

 

Diego Aranha é professor doutor do Instituto de Computação da Unicamp e um dos mais ativos críticos do sistema de votação em uso no Brasil.

 

O advogado Adriano Mendes é especialista em direito digital, atuando também em fusões & aquisições e consultoria tributária. Foi professor de Ética, Direito e Legislação e atualmente é membro efetivo da Comissão de Ciência e Tecnologia da OAB/SP.